Placar no STF é favorável a Estados em disputa sobre créditos de ICMS
Fonte: Valor Econômico
Os Estados estão vencendo, no Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal
(STF), julgamento sobre o direito a créditos de ICMS em operações com
combustível entre empresas do mesmo Estado para a posterior transferência
interestadual do produto. Após quatro votos, três a favor da tese dos governos
estaduais, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro André
Mendonça.
O tema interessa diretamente a Estados e distribuidoras de combustíveis e
indiretamente ao consumidor, que paga o imposto embutido no preço. O
entendimento do processo se aplica a óleos combustíveis derivados de petróleo
e lubrificantes, exceto a gasolina, que é tributada por substituição e não gera
créditos.
Como a decisão terá repercussão geral (Tema 1258), deverá ser seguida por
todas as instâncias inferiores do Judiciário. O caso julgado pelos ministros é da
distribuidora de combustíveis Raízen.
Ela pede o cancelamento de um auto de infração do Estado de Minas Gerais
relativo a operações anteriores à transferência interestadual de combustíveis
derivados de petróleo. No processo, outros 18 Estados se cadastraram como
partes interessadas.
A venda de combustível para outro Estado não está sujeita à cobrança de ICMS,
conforme a imunidade prevista no artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea “b”
da Constituição Federal. Porém, na operação interna, é gerado crédito do
imposto estadual.
Os Estados defendem que, nessa situação, deve ser feito o estorno do crédito
de ICMS. Isso porque o artigo 155 permite essa medida em operações
anteriores nas hipóteses de isenção ou não incidência do imposto.
Para o contribuinte, no entanto, a manutenção dos créditos garante o princípio
da não cumulatividade e da neutralidade tributária nas operações no Estado de
origem. Além disso, alega que o artigo 155 não isenta a operação de imposto,
apenas garante a não tributação da saída do produto pelo Estado de origem. A
tributação pelo Estado de destino, acrescenta, estaria mantida, criando efeito
cascata e encarecendo o produto para o consumidor final.
Relator do processo no Supremo, o ministro Dias Toffoli votou para cancelar
a autuação fiscal. Ele propôs uma tese afirmando que o artigo 155, parágrafo
2º, inciso X, alínea “b”, da Constituição Federal, não permite a anulação dos
créditos do ICMS cobrado nas operações internas.
Abriu a divergência o ministro Alexandre de Moraes. Ele entende que o
dispositivo constitucional avaliado é uma exceção expressa ao princípio da não
cumulatividade. Embora seja uma escolha mais onerosa ao contribuinte, diz
Moraes, trata-se de opção legítima do legislador, que só pode ser modificada
pela via legislativa.
A tese proposta por Moraes diz que a manutenção dos créditos do ICMS nessas
situações de operação interestadual só é possível quando expressamente
prevista em lei. Ele foi acompanhado pelo ministro Flávio Dino e por Cármen
Lúcia.
Uma nota técnica elaborada pela empresa em 2021 e apresentada no processo
calculou que o veto ao aproveitamento poderia provocar um aumento médio
de 22% no preço final dos combustíveis para os consumidores. Uma atualização
desse número apontou que, em 2025, o aumento seria de 19%.
O levantamento é válido para o querosene de aviação, que foi objeto da disputa
no processo, mas a tributação pelo Estado de origem teria impacto também em
outros combustíveis de acordo com a mesma lógica, afirma Ronaldo Redenschi,
do VRA Advogados, que defende a empresa no processo. Segundo ele, o setor
está acompanhando o julgamento com muita preocupação.
O advogado afirma que o Supremo já tem jurisprudência no sentido de que o
pagamento de ICMS apenas no Estado de destino não configura isenção ou
não incidência de imposto, mas apenas deslocamento de competência da
cobrança (RE 198088). Dessa forma, o Estado de origem, que já é beneficiado
pelos royalties da exploração, acabaria se beneficiando duplamente também
com o ICMS sobre as transações internas.
“Se não for permitida a manutenção do crédito, o que se está violando é o
princípio constitucional do destino, permitindo a poucos Estados produtores,
que já foram contemplados com os royalties, se apropriar também da carga
tributária, onerando duplamente o contribuinte, e especialmente o
consumidor”, diz.
Leonardo Roesler, sócio do RCA Advogados, aponta que o impacto econômico
da decisão será significativo. “Para os contribuintes, a manutenção do crédito
representará relevante alívio financeiro, ao evitar a devolução de valores pagos
na cadeia anterior. Para os Estados de origem, contudo, haverá impacto na
arrecadação e possível desequilíbrio no pacto federativo, pois assumiriam o
ônus financeiro de créditos relativos a operações não tributadas”, afirma.
Ele avalia que a questão extrapola o debate tributário e engloba também o
federalismo fiscal brasileiro, por definir “como se deve equilibrar a autonomia
financeira dos Estados e o direito dos contribuintes de não suportarem
cumulatividade indevida”.
Procurado, o Estado de Minas Gerais informou que vai se manifestar nos autos
do processo.